REFORMA TRABALHISTA DEVE SER REVOGADA

EDITORIAL: Impactos da Reforma Trabalhista sobre os direitos dos trabalhadores e sobre a atuação dos Sindicatos

Marcos Santos/USP Imagens Carteira de trabalho
Comunicação
02.MAIO.2022

Por Trindade & Arzeno/Senge-PR

Em outubro de 2017, semanas antes de entrar em vigor a Lei n° 13.467/2017 (que instituiu a chamada “Reforma Trabalhista”), o então Ministro da Economia do Governo Michel Temer, Henrique Meirelles, deu entrevista afirmando que a nova legislação deve gerar mais de 6 milhões de empregos1. A principal bandeira dos defensores da Reforma era a da ‘modernização’2, uma vez que afirmavam que as relações de trabalho regidas pela CLT na época eram engessadas em razão da inflexibilidade do texto legal.

Esta modernização seria concretizada através da flexibilização de diversos direitos garantidos anteriormente pela via legal, pela flexibilização das regras-limite ao poder de negociação coletiva com os Sindicatos obreiros, pela limitação da forma de atuar da Justiça do Trabalho, pela admissão de negociação individual (empregador-trabalhador) acerca de diversos aspectos do contrato de trabalho, pela criação de novas modalidades de contratação e pela regulamentação de outras (contrato intermitente e terceirização, respectivamente), dentre outras medidas.

EMPREGOS NÃO FORAM CRIADOS E INFORMALIDADE CRESCEU

Contudo, passados mais de 05 (cinco) anos da aprovação da “Reforma Trabalhista”, os milhões de emprego não surgiram, e o que se verificou, de fato, foi a visão realista defendida pelas entidades sindicais à época do processo de aprovação da Lei n° 13.467/2017: a Reforma veio para retirar direitos, atacar as organizações coletivas de trabalhadores e, especialmente, precarizar o mundo do trabalho.

Com as regras mais flexibilizadas, houve um incentivo ao crescimento do mercado informal de trabalho (seja através da prestação de serviços de forma autônoma, seja através da prestação de serviços mediante a abertura de uma pessoa jurídica pelo trabalhador – o fenômeno chamado de ‘pejotização), sendo que, conforme levantamento realizado em novembro de 2021, praticamente metade da força de trabalho ativa atualmente (48,7% da população ocupada não possui vínculo formal de emprego)3, sendo que aqueles que possuem vínculo formal sofrem diariamente com uma legislação que deixa cada vez mais aspectos da prestação de serviços ao arbítrio do empregador (como a possibilidade de estabelecimento de acordo individual para a compensação de jornada, a possibilidade de estabelecimento de banco de horas, a possibilidade de reversão do ocupante de cargo de confiança sem a incorporação da gratificação, dentre outros).

Fotos: Pedro Macambira/TRT Paraná

REFORMA DIFICULTOU ACESSO À JUSTIÇA TRABALHISTA

Outro aspecto de relevância diz respeito à alteração de regras envolvendo o processo do trabalho e o acesso dos trabalhadores à Justiça do Trabalho. Neste cenário, buscou-se restringir severamente o direito ao benefício de gratuidade da justiça (em que pese já exista julgamento recente do STF no sentido de que algumas alterações trazidas pela Reforma seriam inconstitucionais), incluindo-se a possibilidade de condenação do trabalhador reclamante ao pagamento de honorários advocatícios, e através da determinação de indicação do valor (ainda que por estimativa) do pedido formulado. A atuação da Justiça do Trabalho em si também foi afetada, mediante restrição da capacidade de edição de Súmulas (que não poderiam criar direitos ou obrigações não previstas em lei) e da explícita previsão de que os Tribunais Trabalhistas deveriam interpretar normas coletivas de forma restritiva.

ENFRAQUECIMENTO SINDICAL DIMINUIU A REPRESENTAÇÃO

Do ponto de vista da atuação do Sindicato, o principal golpe dado pela Reforma diz respeito à retirada da obrigatoriedade de recolhimento da Contribuição Sindical, sem que fosse estabelecida forma de sustento alternativa para as entidades de classe. De acordo com levantamento realizado em fevereiro de 20224, com base em dados do Ministério do Trabalho, a arrecadação das entidades sindicais caiu 97,5% se comparado com o mesmo período em 2017, antes da revogação da obrigatoriedade. Demonstrou-se, com isso, o verdadeiro objetivo com esta medida: o enfraquecimento ou o total desaparecimento das entidades sindicais.

E aliado a este enfraquecimento, foi possível compreender outro aspecto marcante da Reforma: a possibilidade de que o negociado tenha prevalência sobre o legislado. Anteriormente à entrada em vigor da Lei n°13.467/2017 o negociado já tinha prevalência sobre o legislado, desde que as alterações viessem para acrescer direitos e obrigações já previstas na legislação em vigor. Ou seja, os instrumentos coletivos de trabalho poderiam dispor sobre direitos previstos em lei desde que para ampliar seus efeitos.

Trabalhadores mobilizados. Foto: Roberto Parizotti/APEOESP

Com a Reforma Trabalhista abriu-se a possibilidade de que os instrumentos coletivos tenham prevalência sobre a legislação mesmo que para prever patamares mais baixos do que aqueles da lei em vigor – ressalvadas algumas matérias que, ao menos, se resguardou os patamares trazidos na Constituição Federal. Porém, para aspectos de controle de jornada, teletrabalho, banco de horas, remuneração por produtividade (incluindo as gorjetas), e vários outros aspectos é possível a negociação coletiva sendo que a sua disposição terá prevalência sobre a lei.

Somando este aspecto ao fato de que os Sindicatos encontram-se financeiramente enfraquecidos, abre-se a possibilidade de que as empresas abusem de seus poderes econômicos para forçar inúmeras situações desfavoráveis para os trabalhadores – em especial, reduzindo direitos e garantias anteriormente conquistados nos instrumentos coletivos anteriores.

Trindade e Arzeno Advogados Associados

REFORMA PRECARIZOU DIREITOS

E desde a entrada em vigor da Lei n° 13.467/2017 até os dias atuais outras alterações pontuais foram realizadas (via de regra, através de Medidas Provisórias que acabaram não sendo convertidas em lei), sendo a mais recente uma profunda alteração nas regras gerais relativas ao trabalho em regime remoto (teletrabalho), demonstrando que a sanha precarizadora daqueles que ocupam o Poder Executivo e formam a maioria do Poder Legislativo ainda não foi saciada – utilizando-se, lamentavelmente, dos mesmos argumentos (que as reformas flexibilizadoras de direito são necessárias para aquecer a economia, o que a experiência prática provou ser falacioso).

POR QUE REVOGAR A REFORMA TRABALHISTA

A expectativa para o futuro é de que algo mude, sendo que candidatos oriundos do campo progressista já se manifestaram no sentido de revogação total da Reforma, ou no sentido de que deve ser drasticamente alterada como forma de retomar o mínimo garantista que existia em momento anterior.

Se serve de algo, temos a experiência recente da Espanha que revogou no início deste ano a Reforma Trabalhista que havia sido aprovada em 2012, e cujos efeitos foram absolutamente similares aos experimentados aqui no Brasil (precarização e destruição do mundo do trabalho).

A justificativa apresentada pela revogação é justamente a exposição da mentira neoliberal: precarização das condições de trabalho não correspondem a melhora da economia; enfraquecimento dos Sindicatos não corresponde à ampliação das negociações coletivas; e prevalecimento do negociado sobre o legislado em todos os aspectos (inclusive negativos) não corresponde a garantia de direitos.

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