Frota pública de ônibus pode baratear tarifa

Nova concessão em 2025 deve ser debatida imediatamente, avalia especialista

Frota de ônibus de Curitiba - Foto: Daniel Castellano / SMCS
Comunicação
09.MAR.2022

Por Roberto Ghidini, engenheiro civil e especialista em mobilidade*

MADRI – O objetivo deste sucinto texto tem como argumentos o debate, promovido e mediado pelo SENGE-PR, na pessoa do jornalista Manoel Ramires, e pela Rádio Cultura 930 AM que foi ao ar dia 3 deste mês, em que juntamente com o deputado estadual Goura, o vereador professor Euler, a cicloativista Patricia Valverde, tivemos a honra de participar. O tema em foco, tratava do reajuste da tarifa, majorado em 22% (de R$ 4,50 para R$ 5,50) ocorrido após o carnaval, que tem vários matizes a serem considerados e assim foi.

Goura, fez de suas palavras iniciais, críticas à gestão do transporte coletivo por parte da prefeitura e citou o projeto de lei que tramita na assembleia para repasse de subsídios, às cidades de maior porte do estado, com claridade e sem os tais alinhamentos políticos entre Palácio Iguaçu e Palácio 29 de Março apenas.

O professor Euler, comentou sobre a tarifa técnica, algo bastante oportuno, estabelecendo uma correlação de critério para arbitrar um valor de cobrança aos usuários através da Curva de Laffer – um estudo inicialmente realizado para valor de impostos e posteriormente expandido para outros tributos e preços – que deveria-se buscar uma “tarifa ótima”, para obter a máxima rentabilidade e portanto, reduzir ao mínimo a necessidade de subsídios.

A Patrícia, nos colocou, muito bem, todas as dificuldades existentes, desde a falta de informações, a dificuldade de pagar a tarifa (cartão/dinheiro) a integração com outros modais – ainda que sejam poucos, como a bicicleta, os “aplicativos” ou o veículo privado. Ela também ressaltou a importância da diferença de terminologia entre transporte coletivo e transporte público e a necessidade de uma diferente perspectiva e visão de cada modal de transporte.

Para Ghidini, imposto verde, IPTU diferenciado contra a especulação imobiliária indireta e cooperativa de trabalhadores são opções para baratear tarifa

PROPOSTAS PARA OS CUSTOS E TARIFA MAIS BARATAS

De nossa parte, citamos a nebulosa forma de cálculo da tarifa técnica. Destaca-se o fato que de sua apuração, resulta que 34,11% do montante é composto por pagamentos de pessoal e benefício, e 13,12% dizem respeito a encargos e contribuições, sendo esses dois custeios da ordem de quase 50% da tarifa. Para essa porcentagem ainda são acrescidos outros 11,49%, calculada como “rentabilidade justa” (como bem nos lembrou o professor Euler). Neste aspecto, na planilha, chegaríamos a 60% dos “custos” que determinam a tal tarifa técnica.

Ora, dentro deste cenário e dos marcos legais, me parece que é chegado o momento de colocar em marcha um debate amplo sobre a futura concessão de 2025 e se não seria o caso de tornar o transporte coletivo efetivamente público. Passar a ser como o modelo que temos nas grandes cidades daqui da Espanha, incluindo Madri, onde a EMT (Empresa Municipal de Transportes) – os ônibus urbanos, é realmente pública e faz parte do Consórcio Regional de Transporte, juntamente com outra empresa pública, o Metrô de Madrid, as empresas privadas dos Ônibus Intermunicipais da Comunidade de Madrid, da também privada rede de Metrô Ligeiro (VLT) e da estatal mista (Cercanias-RENFE), que opera as linhas de trem (em um total de 10) metropolitanas de curta distância.

Evidentemente, em Curitiba e RMC, não teríamos os sistemas ferroviários e nem metroviários neste mix, somente os sistemas de ônibus, que muito bem poderiam ser de propriedade e operação pública.

De pronto, esses 60% que nos referimos da composição do custo tarifário, seriam absorvidos pela prefeitura, como faz com a de ensino (salários de professores, pedagogos, inspetores de escola e custeio de materiais), com o sistema de saúde municipal (salários de médicos, dentistas, enfermeiros, manutenção, etc.) com a segurança pública (salários de guardas municipais, equipamentos, etc…), absorvendo e não repassando à população.

Com isso, estaria promovendo o transporte público de forma a competir com o transporte privado individual, que bem sabemos das repercussões negativas ao meio ambiente, na saúde das pessoas e na acidentalidade/fatalidade oriundas das ocorrências.

Prefeitura divulga nova tarifa técnica com redução de valor desde 2019

IMPOSTOS VERDE PARA FINANCIAR O SISTEMA

Como formas de financiamento complementar ao pagamento da passagem, para o sistema de transporte público, poderia ser adotado a arrecadação – ou ao menos parte dela – do ICMS dos combustíveis da linha leve (gasolina e etanol apenas), proposta elaborada pelo engenheiro André Caon Lima (Sociedad Peatonal – 2010), que não afetaria os custos de transporte, visto que os veículos de carga utilizam o diesel. A gasolina e o etanol praticamente só são utilizados por veículos de turismo e que são os grandes geradores dos passivos ambientais urbanos.

Também, conforme estudos de vários pesquisadores, inclusive meus, poderia haver uma política fiscal de arrecadação de impostos sobre a propriedade urbana (IPTU), com alíquotas diferenciadas, para os imóveis situados bastante próximos às paradas das estações do transporte de grande capacidade (os expressos). Afinal, sabe-se bem, que ditos imóveis têm valorização potenciadas pelo fato desta proximidade. Isso é usual em políticas TOD (Transit Oriented Development).

COOPERATIVA DE TRANSPORTE

E também, de forma conceitual, com o objetivo de diminuir a eventual carga da mão de obra e de suas implicações contratuais, aos “funcionários” desta empresa pública, novamente um estudo do engenheiro André Caon Lima (Sociedad Peatonal – 2012), propõe, que seja adotado um sistema cooperativista de trabalhadores, possivelmente autogestionado, pelos motoristas, mecânicos, etc. que operariam e manteriam a frota.

Dentro de uma lógica de cidade para o cidadão, de transparência e governo aberto, que defendemos, esse novo modelo, sem os tais “concessionários privados” e com uma empresa pública à frente do transporte coletivo, daremos um importante passo, como bem disse o deputado Goura ao final, para “o que queremos que é um transporte que sirva à cidade e não ao lucros dos empresários”.

*Roberto Ghidini,  radicado em Madri (Espanha), e autor do livro “Transporte Público e Urbanismo – a dinâmica territorial”, o engenheiro civil formado em 1982, é fundador Sociedad Peatonal (2003), Cofundaddor NeReAs.

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