No mundo todo, Estado socorre economia e população do coronavírus

Dinheiro para trabalhadores, estatização e anistia de impostos e contas têm sido adotadas por países para enfrentar a crise; Brasil está fora da curva

Foto: World Economic Forum/Ciaran McCrickard
Imprensa
24.MAR.2020

Por Manoel Ramires/Senge-PR

A mão invisível do mercado e a auto regulamentação da economia são incapazes de enfrentar a pandemia do coronavírus. O fetiche neoliberal baseado na propriedade privada e na não intervenção do Estado na economia e na vida da população está fracassando neste momento com as ações adotadas no mundo inteiro, inclusive em países com governos liberais. O bem estar social voltou para proteger as pessoas. Essa é avaliação do DIEESE, em nota que discute as medidas econômicas e sociais adotadas pelos países que enfrentam a Covid-19. No entanto, o Brasil está fora da curva. Cego na cartilha neoliberal, o país ainda insiste em reformas que ao invés de tratar, matam o futuro da nação.

O primeiro-ministro conservador e ultraliberal, Boris Johnson, responsável pelo Brexit na Inglaterra, foi desses líderes que se renderam a necessidade de o Estado intervir para enfrentar a pandemia. O governo britânico anunciou um pacote de estímulo da economia que prevê recursos da ordem de 38 bilhões de libras (cerca de R$ 223 bilhões) para garantir o pagamento de 80% dos salários dos trabalhadores ingleses a partir de março e ao longo de três meses. Medida oposta da que pretendia adotar o governo Bolsonaro com a MP 297 que permitia o corte de salário dos trabalhadores por até quatro meses.

Socorrendo as empresas
Pelo mundo, as medidas adotadas vão da injeção de recursos na empresas a renda universal, passando até pela estatização. A França anunciou um plano de 45 bilhões de euros para, entre outras ações, ajudar as empresas em dificuldades. Na região de Flandres, na Bélgica, o governo local anunciou um fundo de reserva de 100 milhões de euros de socorro às empresas.  A Alemanha anunciou empréstimos “ilimitados” às empresas afetadas pela pandemia, além de incentivos fiscais. De início, o governo alemão disponibilizará mais de 500 bilhões de euros em crédito para assegurar a liquidez das empresas. Já Portugal adotou diversas ações como linha de crédito de 200 milhões de euros para as empresas e linha de crédito de 60 milhões de euros para microempresas do setor de turismo.

Ajudando os trabalhadores
Não é apenas no Reino Unido que os líderes mundiais entenderam a necessidade de interromper o discurso de cada um por si e “dar o pão para quem não tem como batalhar por ele”. O governo francês está disponibilizando cerca de 300 bilhões de euros para empréstimos bancários e ampliação do plano de “desemprego parcial” (programa de suspensão de contrato de trabalho na França, com pagamento de parte do salário do empregado pelo Estado e oferta de formação profissional). Na Holanda, o governo adotou um programa que prevê o pagamento de até 90% dos salários dos trabalhadores, durante três meses, nas empresas que apresentarem perda de pelo menos 20% da receita. 

Até os EUA planejam enviar recursos diretamente para as famílias, como parte de um pacote de estímulo à economia da ordem de US$ 850 bilhões. A medida prevista propõe doar mil dólares por família.

Estatizar é preciso
Com o colapso do mercado financeiro e o risco de quebra das empresas, o Estado está sendo chamado mais uma vez a socorrer a iniciativa privada. Os EUA deve conceder ajuda de US$ 50 bilhões de dólares ao setor aéreo e comprar de dívidas corporativas de curto prazo das empresas pelo FED. Ainda no setor aéreo, a Itália prevê a nacionalização da companhia aérea Alitalia, que enfrenta grandes dificuldades financeiras há muitos anos. Também prevê um fundo de 600 milhões de euros para o setor aéreo nacional. 

Na Alemanha não está descartada a adoção de programas de recuperação e nacionalização. Já na Espanha se adota medidas de estatização temporária dos serviços privados de saúde para o combate da pandemia. O governo brasileiro, no entanto, não anunciou nenhuma medida nesse sentido. Pelo contrário, as reformas previstas ainda mantêm no radar as privatizações.

Para o DIEESE, “a contradição neoliberal, ao ter que amargar a intervenção do Estado na crise e abandonar, mesmo que momentaneamente, o fetiche da alocação eficiente dos recursos pelo mercado, traz um diferencial importante nessas ações anticíclicas realizadas pelos países”. 

Foto: Isac Nóbrega/PR

Brasil fora da curva

A nota técnica 224 alerta que a forma como cada país lida com a crise gerada pelo coronavírus fará toda a diferença ao final desse difícil período. Terão menos riquezas e mais miséria os países cujos governos não ampliaram despesas, sobretudo as sociais, e escolheram a medíocre estratégia de continuar reduzindo direitos e desonerando o setor produtivo, mantendo intocados os pagamentos dos serviços da dívida.

Este deve ser o rumo do Brasil. Em uma ponta, socorre as empresas e o mercado financeiro, inclusive comprando a carteira de bancos; noutra libera dinheiro que já pertence ao trabalhador, como 13o salário, antecipação do abono e permissão de saque do FGTS. Fundo este que poderão não ser depositados por patrões por três meses. Em outro sentido, oferece apenas R$ 200 como auxílio aos trabalhadores informais, cerca de 41% da cadeia produtiva, aumenta o Bolsa Família em apenas R$ 3,1 bilhões (a Caixa vai destinar até R$ 75 bilhões para bancos e agronegócio) e ainda incentiva a redução de jornada com perda de vencimentos. No Congresso Nacional ainda tramita a PEC que reduz salário do funcionalismo público em 20%.

Na percepção do DIEESE, o Estado intervém principalmente como mediador de ações entre os atores sociais e com reduzido papel de protagonista na mobilização de fundos públicos para o enfrentamento da crise. “O Ministério da Economia está mais preocupado, por exemplo, em fazer avançar nova (a terceira) reforma trabalhista, reduzindo ainda mais os salários e benefícios para aliviar o caixa das empresas, em vez de injetar recursos para tratar da anemia enfrentada pela economia brasileira nos últimos anos”. 

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